"Eu gostava de ter. Mas, não sei, sou suspeito para dizer se tenho ou não. Talvez o problema seja da fita métrica, da bússola, da ampulheta, dos instrumentos que uso ao mensurar as coisas da vida. Nas minhas contas o para sempre é tão grande, tão longo, tão distante, tão pesado, tão rarefeito que só saberei da sua verdade quando eu já não estiver aqui para medir. Mais uma prova de que o infinito e o zero são muito parecidos.
Penso nisso a olhar os telhados de Lisboa, o Tejo a fluir ao fundo, no terraço de um hotel em pleno Chiado. O inverno esvai-se, logo chegará a primavera. Mas eu não estarei aqui para ver o abrir das flores, nem os cravos de Abril. Mais uma vez, estarei do outro lado do oceano, à procura de algo que justifique a separação dos amigos de cá. Um bom motivo (o melhor motivo) são os amigos de lá.
O problema de quem vive com cada pé num continente diferente é estar sempre longe, mesmo estando perto. O coração eternamente meio cheio, meio vazio. Ser emigrante é morrer um pouco a cada partida e renascer um pouco a cada chegada. E renascer (a parte boa do processo) é bonito mas também faz sofrer. Não há parto sem dor, nem mesmo no universo das metáforas.
Independente do que terei pela frente, temo pelo que fica para trás. É tão difícil construir e manter verdadeiras amizades que a distância não augura nunca nada de bom.
Amizade é amor sem contrato. Sendo assim, quando as partes se afastam o lógico seria cada um procurar alguém para a substituição. O que salva é que o coração não tem nada de lógico. Quem ama, mesmo na amizade, é disparatado, irracional, absurdo. Os tolos e os de bom coração (uma redundância) herdarão o reino dos céus.
Quando esta crónica for lida pelos meus amigos portugueses estarei já distante. Que ela sirva de aceno, não só para os meus, como também para os amigos da nova diáspora portuguesa, os exilados pela crise. Só nós sabemos que o Skype é bom mas não resolve. Quem duvida que tente abraçar um computador.
Ou como diria o meu Tio Olavo, em pleno aeroporto do Portela, guitarra em punho, a cantar um sambinha do Chico: “Vai, meu irmão/Pega esse avião/Você tem razão de correr assim/Desse frio, mas beija o Rio de Janeiro/Antes que um aventureiro lance mão/Pede perdão/Pela duração dessa temporada/Mas não diga nada/Que me viu chorando/E pros da pesada/Diz que vou levando/Vê como é que anda/Aquela vida à toa/E se puder me manda/Uma notícia boa”. [No vídeo, ‘Samba de Orly’, com Toquinho e Chico Buarque] "
Tirado Daqui
M.R
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