AMIZADE, AMOR E CUMPLICIDADE
"Porque é que às vezes partilhamos impressões, medos e desabafos com os
nossos melhores amigos que não conseguimos partilhar com a nossa
cara-metade? Não é só porque temos medo de magoar ou de desiludir quem
amamos; também é porque ainda não temos intimidade suficiente que nos
permita faze-lo.
Acredito que a cumplicidade pode ser quase
automática: conhecemos uma pessoa e intuímos muito depressa se nos
sentimos confortáveis na sua companhia, se nos vamos entender, se o
outro vai perceber as nossas piadas. Por isso Vinicius de Moraes diz que
os amigos não se fazem, reconhecem-se.
O entendimento que
criamos com os outros envolve pressupostos que incluem o mesmo tipo de
inteligência, interesses parecidos e valores comuns, ou seja, mais ou
menos a mesma forma de encarar a vida e os problemas que ela nos pode
trazer. O bom entendimento também passa por ter atenção pelo outro;
perceber o que é importante para ele, ouvir as suas histórias, ajuda-lo a
afugentar os seus fantasmas, a arrumar ideias e a fazer escolhas. E em
tudo isto não faço distinção entre amor e amizade porque no que respeita
ao entendimento, este faz tanta falta a um como à outra. Não existem
verdadeiras amizades sem cumplicidade, da mesma forma que o amor
verdadeiro não existe sem entendimento. E aqueles que pensam que pensam
que têm uma história de amor com um amigo com quem por acaso já dormiram
numa noite de copos, não sabem o que é amor, porque o amor é uma
partilha continuada no tempo e comprometida no coração, muito para lá de
uma troca de fluídos inconsequente.
Diz Lawrence Durrel que o
ciúme por uma criação imaginária confina com o ridículo. Mas voltemos ao
entendimento e à cumplicidade: eu acredito que um dos segredos mais
importantes numa relação amorosa é ver no outro o nosso melhor amigo. É
no outro que eu confio acima de tudo, é com ele que partilho o meu
receios mais profundos, as minhas convicções mãos sérias e as minhas
vontades mais frívolas. O problema é que a partilha daquilo que somos e
que sentimos, a capacidade de despir a nossa alma é muito mais difícil
do que despir o nosso corpo e tirar prazer dele.
A intimidade
também se vive debaixo da pele e para que tal aconteça são necessários
anos de convivência. Por vezes o nosso amor pelo outro é tão forte e tão
temerário que julgamos chegar a esse lugar ao fim de alguns meses de
relação. É verdade que vamos a caminho, mas até lá chegar espera-nos uma
viagem mais longa do que imaginámos percorrer. E é durante esta viagem
que se lançam as bases certas ou erradas para a construção de uma
intimidade saudável.
No verão passado o psiquiatra José
Gameiro publicou numa revista semanal um artigo sobre as novas formas de
relacionamento entre casais no qual dizia que hoje as relações são como
queijos émental, ou seja, com buracos; correntes de ar, zonas que
escapam ao outro. A internet é a grande fábrica universal de relações do
tipo émental com o Facebook, os chats e os sites que cada um visita sem
dizer ao outro. Na mesma semana publiquei um post que dizia: a vida era
muito mais fácil quando apple (maçãs) e blackberry (amoras) eram apenas
frutos.
A união numa relação amorosa é fundamental. Cada um
tem de conseguir partilhar com o outro o que sente. Não precisa de lhe
fazer um relatório exaustivo dos seus dias, mas não deve reservar aquilo
que lhe é mais importante e mais querido. A união faz a força, o amor
constrói-se das duas. E o nosso amor deve ser o nosso melhor amigo para
lançar as bases de uma intimidade verdadeira, séria, à prova de todas as
balas e de todos os queijos émental."
Ok é real... a Margarida Rebelo Pinto participa nas nossas conversas... só pode mesmo...
M.O.
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